18 de abril de 2004
Há muitos problemas no urbanismo português. Vou falar de um que penso que é importante. Nem sequer é do foro estético; trata-se de uma forma de organização que não é muito seguida nas novas zonas de construções que por aí vão cogumeleando.
Se parece que os dormitórios são inevitáveis (por falta de vontade política), ao menos que dêem um pouco de dignidade e vida às pessoas que neles vivem. Já tinha reparado neste problema há algum tempo, mas no outro dia afigurou-se-me de forma particularmente clara: na Rua das Musas, antiga Expo 98 – uma rua moderna, estreita, numa zona provavelmente de luxo, em que os prédios estão a acabar de ser construídos.
Devido às dimensões dos prédios, sendo os mesmos de habitação e devido à largura da própria rua, seria o local ideal para construir o bairro ideal (ainda por cima sendo a zona – prédios e arruamentos – de luxo). Quando falo em bairro não pretendo fazer referência aos submundos dos subúrbios, geralmente conotados com as zonas onde habitam as classes mais pobres. Falo do espírito urbano, da vida em cidade, a meu ver, tão ausente de algumas das nossas cidades, em especial nas zonas novas.
Ora, voltemos à Rua das Musas. A rua terá uns 1000 metros de comprimento e tem início no fim do lado sul do antigo recinto da Expo. Ao longo de toda a rua, são raros os prédios que deixaram espaço para lojas (há, no total, cerca de meia-dúzia delas) e mesmo essas, nunca estão rente ao chão. O que é que eu quero dizer com isto? A rua, de um lado e do outro, é quase só parede. Quem lá anda, parece que percorre um túnel. Quando defendo os prédios altos de Nova Iorque, há quem diga logo que as ruas ficam escuras sem luz. Garanto que é muito mais confrangedor andar na Rua das Musas cujos prédios mais altos devem ter no máximo 5 andares. E o problema é que tudo isto apenas serve para tornar a vida dos habitantes nestas zonas muito mais alheada e distante da sua comunidade circundante, ainda para mais num país em que a agregação de comunidades locais costuma ser pouco comum, sobretudo nas cidades.
Não há um café, nem uma mercearia na Rua das Musas. Pior: não há espaço para se abrir um café na Rua das Musas, ou uma mercearia. Pode haver a justificação de que o Vasco da Gama ali tão perto daria cabo do negócio a qualquer pequeno comerciante, mas será que alguém no seu perfeito juízo pensa que uma pessoa vá andar 3 quilómetros para ir buscar um pacote de manteiga, ou tomar uma bica? Só o farão de carro: e aí acabou-se a vida em comunidade. Depois vêm todos os outros problemas, como a falta de muitas infra-estruturas comunitárias, a ausência de alternativas de transportes que só contribuem para o incentivo ao uso do automóvel.
As novas cidades portuguesas são quase todas construídas assim: sem se pensar minimamente no que se faz. E isso causa problemas, desde acidentes rodoviários, à má saúde mental de quem nelas vive.
nice view… 😛
gostei do blog. parabéns.
Concordo em absoluto com o conteúdo deste ‘post’.
Belíssimo blogue.
De acordo! Não podias expressar melhor a minha própria opinião. 🙂
Ricardo