23 de julho de 2014
O Mundial foi catastrófico para o Brasil. Não só perderam em casa, como nem sequer chegaram à final, sem nunca terem jogado um futebol inspirador. Foram humilhados pelos vencedores, a Alemanha, num jogo que acabou em 7–1. Deixaram o Ronaldo perder o recorde de melhor marcador dos Campeonatos do Mundo para Klose, um alemão (e Müller já com 10 golos, conta com 24 anos; se tiver a mesma sorte de Klose, pode ainda ir a dois mundiais). E pior de tudo, a Alemanha tem agora 4 títulos de campeã do mundo – um a menos que o Brasil. Quatro anos é muito tempo e ainda é cedo para apostar, mas tendo em conta o calibre da derrota brasileira, é possível que no mundial russo estejam os alemães mais próximos do penta do que os brasileiros do hexa. Se assim for, não sei quais são o Carmo e a Trindade lá do sítio, mas também devem cair.
Para Portugal, a prestação na competição não foi muito mais honrada. Todos sabemos o que se passou. Que venha o próximo. Mas será que vamos ter problemas? Quando se discutem estes assuntos, há sempre a velha questão de não termos jogadores portugueses nas equipas portuguesas. Há dois aspectos a considerar: um deles é que quando os jogadores se dispersam pelo estrangeiro, tendem a ficar dispersos por várias equipas. O gráfico abaixo mostra, em cada Europeu e Mundial desde 1996, o número de jogadores contribuídos pelos dois (cores escuras) ou três (cores escuras + claras) clubes mais representados na selecção de Portugal (a verde) ou na selecção vencedora (a vermelho).
Embora não seja necessariamente algo obrigatório (vide a França de 1998, ou o Brasil de 2002), a verdade é que nos últimos dez anos, as equipas vencedoras têm pelo menos metade dos 23 jogadores seleccionados a vir de 3 clubes diferentes, senão de apenas dois. A Espanha, no Mundial de há quatro anos, tinha 12 jogadores a vir do Barcelona e do Real Madrid, e mais 4 do Valência. Este ano a Alemanha tinha 7 jogadores do Bayern de Munique, 4 do Borussia Dortmund e 3 do Arsenal. Pelo contrário, na nossa selecção, o clube mais representado foi o Real Madrid, com 3 jogadores, e os 3 clubes que mais contribuíram fizeram-no com apenas 7 jogadores.
Este é, no entanto, um problema praticamente insolúvel: os nossos melhores jogadores serão sempre vendidos, tanto por razões financeiras, como por motivação de quererem jogar em ligas mais competitivas. Ainda assim, com a formação que tivemos, conseguíamos manter jogadores durante 2–3 épocas antes de partirem rumo a novas paragens. Conseguíamos fazer com que houvesse jogadores suficientes a serem lançados.
O outro aspecto a considerar é o de que de há uns anos para cá o número de portugueses a jogar nas equipas nacionais, sobretudo nos três grandes, é assustadoramente pequeno. Na época passada o Sporting tinha 9 portugueses, o Porto 5, e o Benfica 6 dos quais só metade tinha menos de 26 anos. A liga portuguesa, além de formar jogadores nacionais, também tem sido trampolim para muitos jogadores sul-americanos. Mas nos dias que correm o número de jogadores desta zona do mundo é muito grande. Só para termos uma ideia, no mundial que acabou, olhando só para os futebolistas centro- e sul-americanos que se estrearam na Europa em clubes portugueses havia 12 jogadores, de entre os quais o melhor marcador do torneio e 3 presentes na final, sendo que todos eles progrediram mais que a selecção portuguesa (James Rodriguez, Jackson Martinez, Hulk, Ramires, David Luiz, Fucile, Maxi Pereira, Angel Di Maria, Enzo Pérez, Ezequiel Garay, Diego Reyes, e Hector Herrera), não contando com outros como Falcao que se lesionou, ou ainda jogadores quer doutros países (Mangala, Nabil Ghilas, Islam Slimani), quer sul-americanos mas que não se estrearam em Portugal (Marcos Rojo, Juan Quintero).
Mais: a selecção portuguesa está velha. Dos 23 jogadores, só 3 tinham menos de 26 anos de idade (nenhum titular indiscutível e o Rafa nem saiu do banco de suplentes). Em comparação, a Alemanha tinha 14 jogadores com 25 ou menos.
É pouco provável que algum dia tenhamos uma liga suficiente atractiva para nos permitir reter muitos dos melhores jogadores no nosso país. Mas sempre tivemos capacidade de formar jogadores talentosos, sendo que parte dessa formação consiste em lançá-los no nosso campeonato, permitindo-os jogar competitivamente. Mas isso está a deixar de acontecer. Talvez essa seja uma necessidade para termos clubes capazes de lutar nas provas europeias, e é possível que simplesmente não haja talento suficiente em Portugal agora. Mas também é possível que seja uma opção financeira de maximizar lucros, indo buscar jogadores muito baratos em vez de os formar. Um Figo, um Rui Costa, ou um Cristiano Ronaldo, saindo, sempre voltam para, pelo menos, jogar na selecção, mas os Di Maria, Garay ou James Rodriguez já não regressam para nada. E uma coisa é certa, sem jogadores nacionais não há selecção.